domingo, 16 de setembro de 2007

Natureza, História e Arte em Lençóis/Ba


Este blog tem por proposta falar sobre a atividade turística no Brasil, tanto em termos informativos quanto reflexivos, sempre que necessário (e não faltam circunstâncias em que tal necessidade se impõe). Pode parecer que estamos falando demasiadamente da Bahia, mas, garanto, não é proposital. Desta vez, a escolha de Lençóis se deve a um fato premente: aproxima-se um dos mais relevantes eventos da região, o Festival de Inverno. Portanto, não me restou alternativa.

Lençóis é uma das mais belas e importantes cidades históricas do Brasil. Situada na Chapada Diamantina, tem sua evolução histórica intimamente associada aos ciclos do ouro e diamante, responsáveis pela fundação de tantos municípios baianos aqui já citados, como Mucugê, Andaraí, Xique-Xique de Igatu, Palmeiras, Guiné, Caeté-Açu e Rio de Contas. Em seu auge, foi a maior produtora mundial de diamantes, posição hoje ocupada por Angola. Hoje, sua economia se baseia em atividades primárias e Turismo.

Sem fugir à regra, iniciou como um arraial de garimpeiros, no ano de 1845. Há uma lenda a justificar sua denominação: diz que os garimpeiros acamparam no alto do Serrano, cobrindo suas tendas com tecidos brancos que, de longe, pareciam lençóis estendidos. À medida que se fortalecia a atividade mineradora, proprietários de terras e comerciantes – em especial, de alimentos - foram gradualmente se instalando no entorno dos garimpos, tendo em vista a enorme potencialidade de rápido enriquecimento. Em 1856, passou a Comercial Vila de Lençóis, chegando a sediar um consulado francês, no intuito de estreitar os laços comerciais entre Brasil e França.

O garimpo ajudou a consolidar o crescimento de Lençóis até 1871, quando, por ocasião do esgotamento dos solos e a concorrência africana na exploração de pedras preciosas, foi praticamente abandonada por exploradores brasileiros e estrangeiros, amargando anos de muita escassez e pobreza extrema. Foram a cafeicultura e a extração do carbonato, muito utilizado pelas indústrias européias, que, em 1880, vieram a retomar, mesmo que parcialmente, a economia da cidade.

Apresentando um vasto e muito rico casario colonial, Lençóis foi, em 1973, tombada como Patrimônio Histórico Nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), ampliando as oportunidades para o desenvolvimento do Turismo não apenas da região de Lençóis, como de toda a Chapada Diamantina. Chamada cidade-patrimônio, é considerada, pelo “trade” turístico, um dos dez melhores destinos turísticos do país, em especial o ecoturismo. Possui uma boa infra-estrutura turística, com meios de hospedagem, restaurantes e bares, agências de turismo, acesso pela rodovia federal BR-242 e um aeroporto, que recebe vôos regulares. È a partir de Lençóis que a grande maioria dos roteiros ecoturísticos da região são organizados.

Embora costume ser muito lembrada por suas belezas naturais, aliás, como toda a Chapada, a cidade conta com uma variada oferta de atrativos históricos e culturais, começando por suas ruas pavimentadas, por escravos, em pedras. Entre os principais atrativos, destacam-se: a Igreja Nossa Senhora do Rosário, cuja construção, em estilo rural, data da segunda metade do século XIX; o Mercado Municipal, situado na Praça Aureliano Sá (antiga Praça dos Nagôs, em virtude de haver sediado intenso comércio de escravos), cuja construção teve início no século XIX com conclusão apenas em meados de 1900. Atualmente, sua importância se deve ao fato de sediar um centro de atividades culturais; o Campus Avançado da Universidade Estadual de Feira de Santana, onde estão os museus do Jarê, do Garimpo e o Geológico. Esta construção pertenceu a uma respeitada figura do século passado, Sinhazinha Sobral; a Igreja Senhor dos Passos, padroeiro dos garimpeiros, cuja imagem foi trazida de Portugal em 1852. Foi construída na segunda metade do século XIX por escravos em adobe em um período de 90 dias; o Casarão no alto do bairro São Félix, ex-quartel-general do coronel Horácio de Mattos, figura lendária da região, tendo sido prefeito de Lençóis, deputado e senador, além de haver lutado contra a Coluna Prestes dos sertões baianos; a Casa de Cultura Afrânio Peixoto, em que funciona um museu e uma biblioteca, com informações sobre a vida do famoso escritor. Funciona de 2ª a 6ª feiras, das 8:00 às 18:00h; a Praça do Coreto, com características típicas de interior, constitui ponto de encontro da comunidade local, em seu cotidiano, mas, principalmente, em apresentações musicais, a exemplo da Lyra Popular de Lençóis; o Antigo Prédio da Prefeitura, chamado Palacete do Cel. César Sá, construído em 1860 com influências neoclássicas. Com recursos do programa Monumenta, uma parceria entre o Ministério da Cultura e o Banco Mundial, foi transformado em museu; a Biblioteca Pública Urbano Duarte, casa em que nasceu um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, abriga a biblioteca municipal, fonte de estudo e pesquisa de estudantes, visitantes e curiosos; o Antigo Vice-Consulado Francês, localizado na Praça Horácio de Matos, importante centro econômico da época do garimpo, onde se travava o comércio direto com a Europa; as praças Horácio de Matos e dos Nagôs, com belíssimos casarões em estilo colonial, revelando a história e o luxo do período áureo do garimpo.

O Ecoturismo em Lençóis mais que se justifica: além das típicas formações rochosas de chapada, há também muitos rios, com águas ainda cristalinas; cachoeiras diversas; grutas e cavernas; morros; poços de águas, com colorações variadas, com predomínio do azul e do mate (em função da decomposição das folhas das árvores que caem a todo o momento, tendo em vista a elevada umidade climática da região); fauna e flora riquíssimas; e muitas trilhas a dar acesso a um mundo realmente inesquecível. Aventura não falta, permitindo a prática tanto de suaves caminhadas quanto de esportes radicais, como “rappel”, “canyoning”, “trekking”, mergulho profundo e de superfície, arborismo, espeleologia. Há, em toda a região da Chapada Diamantina, grande oferta de serviços em agências de viagens especializadas.

Nesse ano, apesar das ameaças de não se realizar por falta de patrocínio, será no período de 19 a 23 de setembro que Lençóis sediará a 9ª edição do Festival de Inverno, um evento aberto ao público, sem cobrança de ingresso. O festival acontece há oito anos e, tradicionalmente, ocorre entre julho e agosto, meses de auge da estação invernal. Envolve uma dinâmica bastante enriquecedora, pois, nele, são promovidas diversas Oficinas Culturais sobre temas variados - teatro, dança, música, fotografia, fabricação de brinquedos e muito artesanato – buscando-se sempre a comunhão de arte, música e educação. A programação inclui também eventos esportivos; manifestações de caráter popular (grupos folclóricos); apresentações teatrais; shows com atrações locais, como o cantor baiano Gerônimo, e nacionais, em que grandes nomes da música popular brasileira se apresentam, a exemplo de Gal Costa, Los Hermanos, Zizi Possi, Luiz Melodia e Lobão.

Apesar de sua relevância econômica e cultural para a cidade de Lençóis e seu entorno, cabe refletir sobre as condições em que o evento acontece. De cara, uma questão essencial: são esperados aproximadamente 25 mil pessoas entre turistas e residentes locais. Todo esse fluxo atende à efetiva capacidade de carga turística da região? A infra-estrutura local - abastecimento de água, esgotamento sanitário, alimentação, hospedagem, transportes, comunicações etc – suporta essa sobrecarga? O evento promove a inclusão social da comunidade local? Não podemos esquecer que não só Lençóis mas toda a Chapada Diamantina são patrimônios naturais e culturais inestimáveis, e que cabe aos órgãos públicos, empresários e toda a sociedade civil prezarem por sua sustentabilidade econômica, social e ambiental.

P.S.: Imagens retiradas do Google Images.

4 comentários:

Ana Camila disse...

Dulce e Victor, queridos, esse blog tá uma delícia! Que maravilha essa passagem pela história de Lençóis, vou dar uma passada lá no festival semana que vem :)

Dulce Bulcão disse...

Tô morrendo de inveja, queria muito ir. A Chapada é sempre maravilhosa, apesar de tantas carências. Quando voltar, dê-nos notícias para que possamos publicar no blog. Ah, e tire muitas fotos. A gente agradece...Bjs

Unknown disse...

O blog está realmente muito bom.. mas a data do festival está errada. Se eu não me engano mudou para 24 a 28, ou de setembro ou de outubro, não sei bem ao certo..
bjz..

Anônimo disse...

Dulce Bulcão,

Bom dia (04:18), Meu nome é Iago Marinho, tudo em paz?!

Creio serem muito pertinentes seus questionamentos sobre o Festival de Inverno/Lençóis em 2007: sustentabilidade, etc.

Estou morando aqui há 02 anos e alguns meses, e gostaria de publicar este seu texto na íntegra, ou então trechos dele, pois são realmente ATEMPORAIS, para em qualquer época se saber como fazer algo equilibrado, sem carências para a Chapada Diamantina em 2008 e nos próximos que virão.

O site está no ar há 04 meses e tivemos um público bem modesto, mas de 6mil pessoas. E vem crescendo a busca sobre a Chapada.

Se tiver interesse, e for possível, entre em
www.CIDADEDOSDIAMANTES.com.br

Mande um e-mail para contato@cidadedosdiamantes.com.br

Ou (75) 9931-4515

Obrigado pela atenção...